O Brasil renova sua presença na 60ª Exposição Internacional de Arte com a mostra ‘Ka’a Pûera: nós somos pássaros que andam’; destacando a resistência e a produção artística dos povos originários brasileiros, atualizando as problemáticas da colonização
O Pavilhão Hãhãwpuá, como é chamado o Pavilhão do Brasil durante a 60ª Bienal de Veneza, apresenta a exposição ‘Ka’a Pûera: nós somos pássaros que andam’, com curadoria de Arissana Pataxó, Denilson Baniwa e Gustavo Caboco Wapichana. Esta mostra destaca a resiliência e a produção artística dos povos originários brasileiros, explorando as problemáticas da colonização, a partir da produção de Glicéria Tupinambá com a Comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro e Olivença, na Bahia; Olinda Tupinambá e Ziel Karapotó.
“A mostra reúne a Comunidade Tupinambá e artistas pertencentes a povos do litoral – os primeiros a serem transformados em estrangeiros no seu próprio Hãhãw (território ancestral) – a fim de expressar uma outra perspectiva sobre o amplo território onde vivem mais de trezentos povos indígenas (Hãhãwpuá). O Pavilhão Hãhãwpuá narra uma história da resistência indígena no Brasil, a força do corpo presente nas retomadas de território e as adaptações frente às urgências climáticas”, destaca o material de divulgação.
Os Tupinambá eram considerados extintos até o ano de 2001, quando finalmente o Estado Brasileiro reconheceu que esse povo não só nunca havia sido exterminado, como está ativo na luta para reaver seu território e parte de sua cultura que fora retirada pela colonização. “A exposição é realizada no ano em que um dos mantos tupinambá retorna ao Brasil depois de um longo período no exílio europeu, onde estava desde 1699 como um preso político. A vestimenta atravessa tempos e atualiza as problemáticas da colonização, enquanto os Tupinambá e outros povos continuam suas lutas anticoloniais em seus territórios – como Ka’a Pûera, pássaros que andam sobre florestas que ressurgem”, complementam os curadores.
A mostra aborda questões de marginalização, desterritorialização e violação de direitos, convidando à reflexão sobre resistência e a essência compartilhada da humanidade, pássaros, memória e natureza. O Pavilhão Hãhãwpuá reforça a identidade indígena ao apresentar uma perspectiva urgente para o mundo, alinhada ao tema global da Bienal. O nome “Hãhãwpuá” – usado pelos Pataxó para se referirem ao território que, depois da colonização, ficou conhecido como Brasil – simboliza o País como território indígena, refletindo a diversidade cultural e a rica história dos povos originários.
Andrea Pinheiro, presidente da Fundação Bienal de São Paulo, ressalta: “Vivemos um momento de convergência entre o passado, o presente e o futuro para encontrarmos um caminho para modos de vida sustentáveis e a repactuação das relações humanas. As questões levantadas pelo trabalho dos curadores e artistas apontam para caminhos relevantes para o árduo processo que temos pela frente”.
As obras
Glicéria Tupinambá convoca os mantos de seu povo para formar a instalação Okará Assojaba. Okará é uma assembleia da sociedade Tupinambá cujo objetivo é criar um conselho de escuta onde se reúnem os líderes que são portadores dos mantos tupinambá: as mulheres, os pajés e os caciques. A instalação Okará Assojaba faz referência a essa assembleia ao trazer um manto tupinambá produzido por Glicéria de modo coletivo com sua família e a Comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro, acompanhado por mantos/tarrafas (redes de pesca).
A instalação ainda é composta por cartas escritas por Glicéria, assinadas em conjunto com a Associação dos Índios Tupinambá da Serra do Padeiro e enviadas aos museus que possuem mantos tupinambá e outras partes de sua cultura em seus acervos.
Em ‘Dobra do tempo infinito‘, uma videoinstalação com sementes, terra, redes de arrasto e jererés, Glicéria Tupinambá cria conexões entre as tramas das redes de pesca e a dos trajes tradicionais.
Com a videoinstalação Equilíbrio, Olinda Tupinambá, por sua vez, amplia a voz de Kaapora – entidade espiritual vigilante da nossa relação com o planeta e que também dá nome ao projeto de ativismo ambiental conduzido por ela na Terra Indígena Caramuru.
Ziel Karapotó, por fim, confronta processos coloniais em ‘Cardume 2‘, uma instalação que une, com uma rede de tarrafa, maracás de cabaça e réplicas de projéteis balísticos, envolvidos por uma paisagem sonora com sons de rios e torés (cantos tradicionais do povo Karapotó) que se misturam a sons de disparos de armas de fogo. ‘Cardume 2’ evoca a luta pelos territórios frente aos processos de genocídio que se atualizam nos últimos anos.
Confira o vídeo com o curador Denilson Baniwa:
https://drive.google.com/file/d/1YDpauEW2GEOwl_7AaZ-0V9CySXf81aUE/view?usp=drive_link
O termo Hãhãwpuá
Nesta edição, o Pavilhão do Brasil é referido pelos curadores como Pavilhão Hãhãwpuá, simbolizando o País como território indígena, com “Hãhãw” significando ‘terra’ na língua patxohã.
O nome “Hãhãwpuá” é usado pelos Pataxó para se referirem ao território que, depois da colonização, ficou conhecido como Brasil, mas que já teve, e tem, muitos outros nomes.
Com informações e fotos da assessoria